Nos últimos anos ficou nítido que o gênero de super-heróis chegou ao seu apogeu e inevitavelmente começou a entrar em estado de declínio. Porém, os grandes estúdios hollywoodianos, presenciando tal fenômeno, buscaram uma forma de continuar utilizando os quadrinhos de heróis como fonte de criatividade, garimpando novas histórias.
Nesse contexto, começaram a surgir os filmes de super-vilões. Venom, Morbius, Kraven e Loki são alguns dos personagens que tiveram seus projetos desenvolvidos, mas é inegável que “Coringa” de Todd Phillips se destacou desse novo seguimento.
Em 2019, quando o primeiro longa com Joaquin Phoenix como personagem principal fez sua estreia, seu enredo maduro e suas referências ao cinema clássico (principalmente a obras como “Taxi Driver” e “O Rei da Comédia”) chamaram atenção.
Somando sua ácida crítica social ao descaso com os pacientes de patologias mentais do sistema de saúde norte americano, o filme se tornou um sucesso, tanto com os fãs de quadrinhos, quanto com a critica especializada.
Em “Coringa: delírio a Dois”, o diretor Todd Phillips busca traçar o caminho inverso, desconstruindo o personagem que foi tão magistralmente construído na produção anetrior, enquanto trabalha sua trama utilizando números musicais – gênero impopular entre os mais jovens – e esse processo de experimentação pode desagradar o público como um todo.
Na trama, acompanhamos Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) aguardando seu julgamento em cativeiro. Ele conhece Lee (Lady Gaga), uma detenta que se diz fã do Coringa e acaba desenvolvendo um relacionamento com ela.
Contudo, esse romance inebriante vai abalar a estratégia do julgamento do personagem principal, quando começa a trazer à tona parte daquele sentimento de indignação que o motivou a cometer os crimes pelos quais foi condenado.
A parte técnica do longa se mostra impecável, com uma fotografia belíssima e criativa, uma narrativa envolvente. Os “temíveis” números musicais são bem dirigidos e estão inseridos estrategicamente em pontos da narrativa onde podemos nos aprofundar melhor na perspectiva do personagem principal.
Outro destaque a apontar é a atuação, tanto de Joaquin Phoenix quanto de Lady Gaga, que aqui nos apresenta uma versão bem diferente da Arlequina com a qual estamos acostumados, muito intrigante e com um papel central para a desconstrução de Artur Fleck como Coringa.
A carreira musical de Lady Gaga também é bem utilizada pois as sequências musicais das quais ela participa são de fato maravilhosas e roubam a tiram a atenção a do protagonista. O que, no contexto da obra e sobre o que o roteiro se propõe para a personagem, faz todo sentido.
Apesar dos pontos positivos, “Coringa: delírio a Dois” se ancora na boa atuação dos atores e na parte técnica como um todo. Não tem um roteiro complexo como o primeiro longa, é mais um conceito que vai sendo explorado artisticamente enquanto a trama avança.
Em meio a isso, críticas sobre a espetacularização da violência e dos julgamentos são tecidas, assim como a mídia buscar lucrar com a desgraça da desigualdade social, todavia, o assunto fica esquecido e relegado às entrelinhas em meio à experimentação cinematográfica do diretor.
Para os amantes do cinema como mídia, “Coringa: Delírio a Dois” é interessante, ao fugir das formas convencionais, além de fazer diversas homenagens à história da sétima arte como um todo.
Por outro lado, o filme se afasta tanto de sua inspiração das histórias em quadrinhos que só o nome do personagem ficou. Talvez fosse mais bem recebido se tivesse outro título diferente.
por Marcel Melinsk – especial para EOL
*Título assistido em Pré-Estreia promovida pelo Cine Araújo.
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