Crítica: “A Livraria”

Baseado na obra homônima de Penelope Fitzgerald, e vencedor em três categorias do Prêmio Goya, incluindo Melhor Filme, o drama “A Livraria” (The Bookshop) é uma linda – e triste – homenagem a quem encontra nas páginas de livros, a segurança e compreensão que muitas vezes nos são negadas no mundo real.

A trama dirigida por Isabel Coixet se passa em Hardborough, uma pequena cidade no interior da Inglaterra, em meados de 1959 e tem como protagonista Florence Green (Emily Mortimer), viúva de guerra há 16 anos, que decide abrir a tal livraria do título na região. Para isso, adquire uma propriedade conhecida como The Old House (“A Casa Velha”, em tradução literal), rótulo este que será aproveitado por ela para nomear seu estabelecimento – que também é sua moradia.

É penoso perceber o quão inglória é a batalha travada por Florence, para conseguir o apreço dos moradores pela ideia de ter uma loja de livros à disposição. A ausência do hábito da leitura, para muitos, parece absolutamente normal e não há nenhum pudor em afirmar que “ler é monótono”.

Ainda assim, mesmo com a situação indicando que esse talvez não fosse o melhor caminho, a personagem inaugura a livraria e a partir daí verá sua vida mudar de maneira radical. Sob a proteção silenciosa de centenas de obras, ela vai estreitar a amizade com sua ajudante, a geniosa garotinha Christine (Honor Kneafsey), que também faz parte dos que não veem graça na leitura. E causará grande tumulto ao expor em sua vitrine, a novidade recém-chegada, “Lolita”.

Se por um lado, a protagonista sofrerá ameaças da influente e manipuladora Violet Gamart (Patrícia Clarkson), que declara sua vontade de expulsá-la de sua morada, para transformar o local em um improvável centro de artes – ainda que tal proposta pareça muito distante da realidade que as cerca -, por outro, conhecerá uma das figuras mais ilustres e misteriosas da cidade.

Tal personagem atende pelo nome de Edmund Brundish (Bill Nighy) e é um homem recluso há 45 anos, desde o trágico falecimento de sua esposa – pelo menos é essa a versão mais recente da história, contada nas rodas de conversa dos mais diversos habitantes. Em comum, ele e Florence perceberão o respeito e o amor pelos livros, os quais prefere imaginar serem criações espontâneas da natureza, não da imaginação de pessoas comuns (uma vez que tem um grave problema em lidar com a ideia de socializar).

Apesar de não ter lido a obra na qual se baseia, pareceu-me que a narrativa teve bastante influência do texto original, uma vez que em muitas passagens, é possível reconhecer um estilo que também seria eficiente no papel. Já a fotografia de Jean-Claude Larrieu mostra a cidade como um lugar frio – não só em seu clima, mas também em sua acolhida pouco amigável – e transforma a livraria em um lugar ainda mais diferenciado e especial. Uma luz no meio da escuridão.

Florence entrou para minha (vasta, é verdade) lista de personagens que gostaria que fossem reais. Para lhe agradecer por colocar em palavras o que sinto diante dos amados livros em minha estante e para dizer o quão adorável ela ficou em seu vestido “bordô muito escuro”.

Para os amantes de leitura.

por Angela Debellis

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.

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